quinta-feira, 14 de março de 2013

MULHERES DE TALIT - VIOLAÇÃO OU NOVA TRADIÇÃO?

Nestes dias tenho lido algumas posições muito fortes contra as 300 Mulheres do Muro que forçaram a barra e entraram na área feminina do Kotel, com talitot (xales de oração) para fazer as orações delas debaixo de agressões verbais e sopros do shofar dos hassidim e hareidim do lado masculino. Precisa ficar claro para todos que o uso do talit apenas pelo homem é tradição: não é legislação judaica (halachá). Um dos pontos focais da lei judaica é TRADICIONALMENTE TAMBÉM: "Se não está expressamente proibido, pode ser feito." Não há proibição da mulher usar o talit como não há obrigação do homem usar o talit.

Por acaso você já viu alguma sinagoga ou alguém no Kotel EXIGIR AOS HOMENS PRESENTES o uso do Talit? Isso não acontece porque essa é a forma correta de agir. Com a kipá ocorre a mesmíssima coisa. Não há nem obrigação nem proibição, tanto que no ramo reformista inteiro, os homens não usam a kipá. Sequer "cobrir a cabeça" (pela tonelada de motivos sugeridos pelos mais diversos rabinos) é uma obrigação, mas talvez seja nossa mais enfática tradição. E caso todos achassem isso especificamente válido, todos o fariam, mas estamos muito longe disto.

Mas as posições que me incomodam profundamente são das pessoas, algumas de fato obtusas e outras comprovadamente inteligentíssimas que afirmam "É uma tradição então TEM QUE SER CUMPRIDA!"

Estas pessoas não conseguem entender que tal tradição por ser afeita ao ramo judaico onde ela cresceu ou está, pode não ter nada a ver com outro ou outros ramos judaicos. Não temos centralização clerical ou teológica. Não existem vaticanos judaicos, papas judaicos, ou encíclicas judaicas. Deve ser pela nossa heterogeneidade que estão tentando acabar com nossa fé e não conseguem porque não há um ponto focal que derrube todos os ramos. Hoje, pode-se citar pelo menos umas 12 designações judaicas maiores que se afirmam ortodoxas ou se afirmam religiosas quase todas elas são teologicamente opostas e excludentes umas as outras. Isso não inclui o judeu não se define como religioso, mas apenas faz o que lhe permite sentir-se bem consigo mesmo dentro da religião. É um círculo de ramos onde um coloca a mão no ombro do que está a sua frente e diz: "você não é judeu...", mas é um círculo e não um reta!

A estas pessoas que IMAGINAM que tradição é algo PARA SER CUMPRIDO, peço um segundo de consideração a ideia absolutamente verdadeira de que nenhuma tradição COMEÇOU SEM SER EXATAMENTE A NOVIDADE CONTRAPOSTA ÀS TRADIÇÕES ANTERIORES! Isso é a mais nítida das verdades e é muito simples de compreender.

O que se vê atualmente como o estereótipo dos judeus de roupas pretas (nas mais diversas formas divididas por grupo) é apenas o formato hassídico, afeto aos que militam no ramo hassídico iniciado no século 18 como MODERNIDADE E OPOSIÇÃO, principalmente aos judeus de Vilna, e consolidado em meados do século 19 na Europa Oriental, exatamente quando na Europa Ocidental se consolidava a Reforma e o Liberalismo (coisas diferentes).

Estes grupos cresceram juntos. Foram contemporâneos em seu surgimento pelas necessidades localizadas. Mas quando são colocados juntos na mesma praça, defronte ao mesmo muro que é tanto de uns quanto de outros as diferenças ficam violentamente aparentes e em algum momento os ramos precisam compreender que são da mesma árvore e nenhum árvore possui galhos iguais e simétricos.

Dizem por aí e os religiosos escutam mais facilmente que a destruição do Segundo Templo e sua não reconstrução deve-se a cisão judaica, inicialmente a de 2.000 anos atrás e depois disso sua manutenção e modificação. Seria um conceito muito louco afirmar que a solução para tal cisão é a COMPREENSÃO E ACEITAÇÃO DO OUTRO e não a submissão do outro ao meu conceito. Creio que não haja para quem falar isso.

Quanto o leiteiro Tevie,no Um Violinista no Telhado diz: “Tradição? Não sei quando começou, mas é tradição”, ele está certo, mas era um leiteiro de shtetel. Você não é!

José Roitberg - jornalista

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