sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

RENOVAÇÃO DA FROTA DE ÔNIBUS - tente entender esta conta

Um ônibus com ar-condicionado fora do padrão exigido pela lei aprovada para o município do Rio de Janeiro em 2012, que previa 100% da frota refrescada para a Copa de 2014, custa aí pelos 500 mil reais. O preço pode chegar a 1 milhão no caso dos ônibus articulados como do BRT ou em uso em SP.

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Frescão de 40 anos atrás era um ônibus rodoviário em uso urbano. Naquela época o motor traseiro aumentava o conforto. O Brasil possuiu grande frota de ônibus com motores traseiros, todos desenvolvidos a partir do zero para serem ônibus, diferente dos ônibus com motor dianteiro que são carrocerias adaptadas sobre mecânicas mais baratas e desconfortáveis de caminhões. Foto do blog rodrigomattardotcom.wordpress.com

O curioso é que o RJ introduziu os ônibus com ar-condicionado há 40 anos atrás, com os "frescões". Os jovens nem sabem que isto existiu. Funcionava! A tarifa era mais cara, ainda assim uma fração do que custaria fazer a viagem em taxi, com o agravante de que há 40 anos atrás os taxis eram Fuscas só com banco traseiro, o VW "Zé do Caixão" com suas espetaculares 4 portas e ainda outras coisas piores. Opalas com ar-condicionado eram apenas Taxis especiais do aeroporto. Assim, o Frescão cumpria o que prometia e existe até hoje, com passagens entre R$ 8 e 13,50 contribuindo apenas com 695 veículos da frota total da cidade.

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Este Frescão em foto de 1975, foi o modelo mais bem sucedido e confortável em circulação no Rio de Janeiro. Foto do blog www.skyscrapercity.com

Se você está apenas na Zona Sul do Rio de Janeiro pode imaginar que há muitos ônibus com ar-condiciona, mas são apenas 741. Portanto, o RJ, hoje possui 1.436 veículos com ar-condicionado (os BRTs não entram nestas contas) de uma frota de 9.000 ônibus. A meta atual é que até o final de 2015, metade das viagens de ônibus no RJ sejam com ar-condicionado, o que parece pouco exequível.

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O Fusca taxi representava quase a totalidade da frota no Rio de Janeiro. Com apenas uma porta, o banco dianteiro foi retirado por força de lei e a cordinha para fechar a porta foi o acessório mais barato e difundido da história. Foto Extra-O Globo.

Já São Paulo, aprovou a lei que obriga toda a sua frota de ônibus a ter ar-condicionado, sem prazo determinado, apenas em outubro do ano passado, isto mesmo, apenas em 2014. Segundo os jornais de hoje, há 60 (sessenta ônibus com ar-condicionado) circulando em SP e até o final de fevereiro espera-se 'quase' dobrar, chegando aos 110 veículos. Fica faltando apenas a troca de outros 15.000...

O padrão carioca de ônibus com motor traseiro, piso rebaixado, suspensão a ar e câmbio automático, lamentavelmente foi sepultado e o que vemos nos últimos dois meses é uma proliferação de novos ônibus de modelos velhos, de quase 10 anos atrás, maquiados com faróis e lanternas super-modernos para parecerem coisas novas, mas infelizmente não são. O governo abriu as pernas e o legislativo não cobra explicações. A única coisa mantida foi a decisão de que só serão emplacados ônibus com ar-condicionado no Rio. Alguns tem câmbio automático, a maioria não tem.

Uns dizem que foram os 20 centavos, outros afirmam que os atuais 40 centavos resolvem. Então tente entender. A alegação de que os 40 centavos a mais nas passagens permitirão a renovação da frota é estranha. No preço mais baixo, um ônibus de meio milhão dependeria de 1.250.000 passageiros pagando 40 centavos a mais para ser adquirido. No caso de SP, onde a frota de articulados é fundamental, seriam 2.500.000 de passageiros para pagar um só ônibus. Como precisam comprar 15.000, então temos o número quase impossível de compreender de que seriam necessárias 37.500.000.000 trinta e sete bilhões e quinhentas milhões de viagens, de passageiros pagos, para que estes 40 centavos permitissem a renovação total da frota!

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VW 1600 Zé do Caixão taxi, revolucionou o mercado e permitiu transportar com economia 3 ou até 4 passageiros. O porta-malas dianteiro era consideravelmente grande. Foto do blog www.essevaleumafoto.com

Segundo a prefeitura de SP, são transportados quase 10 milhões de passageiros por dia. O número é total, pois as gratuidades são diluídas pelo valor das passagens além de subsídio público. Assim seriam necessários 3.750 dias, praticamente 10 anos para que estes hoje 40 centavos permitissem a troca total da frota.

Para se ter uma ideia correta da diferença da dimensão de SP para o RJ, em SP são quase 300 milhões de passageiros por mês e no RJ, onde todos os dados estão disponíveis pela transparência administrativa, em outubro de 2014 foram 117 milhões de passageiros, dos quais 20.258.000 pela gratuidade. Estão empregados no setor, no Rio de Janeiro 40.688 trabalhadores. A frota no RJ possui pouco mais de 9.000 ônibus. Assim vemos que a frota de SP transporta quase três vezes mais passageiros que a do RJ com pouco mais de 60% a mais de ônibus apenas, o que significa sufoco por lá, e intervalos grandes entre os ônibus das mesmas linhas.

DIÁRIO DA NOITE 12-OUT-1937 - PIERROT - MARIA YVONNE
Lote de 83 ônibus com ar-condicionado e câmbio automático, mas sem piso rebaixado e sem motor traseiro chegados ao RJ. Foto da Rio Ônibus.

Mas será existem estes 22.000 veículos com ar-condicionado para serem distribuídos apenas pelas cidades do RJ e SP, sem levar em conta todo o restante do Brasil? Segundo A FABUS - Associação Nacional dos Fabricantes de Ônibus, também muito transparente, em 2014 foram produzidas 15.518 carrocerias de ônibus urbanos e 5.423 de ônibus rodoviários. Deste total, mais de 3.200 foram exportados. Não há indicação de quantos modelos com e sem ar foram produzidos.

Com este volume de produção, com a média de 1.293 unidades/mês, o que temos visto são lotes de 50 ônibus novos/mês aqui, 60 ali, raramente uma entrada de mais de 80 unidades, como ocorreu em dezembro para uma das empresas cariocas. Portanto se for mantida uma média abaixo das 100 unidades novas por mês para Rio e São Paulo, podemos esperar 80 meses para o RJ (6,7 anos) e 150 meses para SP (12,5 anos) para a frota estar inteiramente refrigerada. E quem sabe onde estaremos daqui a 2 ou 3 anos, muito menos  daqui a 7 ou 12 anos.