quarta-feira, 16 de março de 2011

E o Mundo descobriu

O Papa Bento XVI lançou um livro. É o volume 2 de suas considerações sobre Jesus Cristo. A mídia mundial ricocheteou para todos os lados que o Papa "... disse que os judeus não mataram Jesus...", "... que os judeus não possuem a culpa coletiva por isso...". Viva! Dizem por aí. Até que enfim! O governo de Israel aplaude!

Então o que há de errado?

Bento XVI apenas está praticando o texto de um dos cinco decretos do Concílio Vaticano II, convocado em 1962. Este encontro, note bem, o segundo da história da Igreja, era para  traçar os rumos modernos do catolicismo, e foi duro.

A sessão durou mais de dois anos, só se encerrando em dezembro de 1965. Começou com o Papa João XXIII e terminou com o Papa Paulo VI.

E um dos artigos, que provocou uma cisão na Igreja foi o que absolveu os judeus da culpa coletiva pela morte de Jesus. Nosso Ratzinger atual apenas ratifica isso.

Ué? Então quer dizer que isso que comemoramos como novidade é coisa de 46 anos atrás? Então porque "eu não sabia" e porque parece que nada mudou de lá para cá?

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A foto desta nota é a publicada pela Folha de São Paulo no dia 29 de outubro de 1965. A única referência que há no jornal, já sob censura militar são algumas palavras na legenda. Não há matérias, não há comentários, não há editorias. Não há nada. Ou seja: o povo brasileiro não foi informado sobre isso quando aconteceu. Depois, tornou-se notícia velha.

Mesmo na página 2, o que era mais importante? Naves espaciais se acoplando pela primeira vez? Confirmação da identidade do carrasco nazista que alugava aviões na Lagoa Rogdrigo de Freitas- RJ (pag 1 abaixo) esfaqueado por um judeu (não foi preso) em Montevideu? Ou será que era a manchete de primeira página, onde o governo militar establecia o Ato Institucional para cassação dos mandatos e direitos políticos (mais abaixo)? É claro que meia linha sobre a absolvição dos judeus, passou completamente irrelevante naquele momento.

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Pesquisamos os jornais do início de 1965 até o final de 1966 para termos certeza de que não houve a divulgação da absolvição dos judeus e não houve mesmo. Além disso, ramos fortes do catolicismo brasileiro são ligados a Martinho Lutero e ao Cardeal Lefebvre (o que não aceitou as decisões do Concílio Vaticano II), assim, nestes 43 anos, vivemos num limbo ideológico: o Vaticano mudou, mas as bases no Brasil não mudaram. Vamos ver se agora engrena.

Vários grupos cristãos (evangélicos) adotam a posição de não culpabilidade dos judeus, tanto no Brasil quanto em outros países, chegando a haver encontros públicos com a comunidade judaica para deixar bem clara esta questão.

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José Roitberg – jornalista

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